Dr. Lustosa

 
A cera Dr. Lustosa é uma mistura de cera de abelha líquida, aquecida em 2 fogareiros a gás, com o ácido fênico, essência de cravo-da-índia e outro componente que é o grande segredo da fórmula, pois distribui por igual os ingredientes, sobre todas as partes da cera.

A história desse milagre artesanal contra a dor de dente, que vem resistindo a todas as modernizações da indústria farmacêutica, iniciou-se por volta de 1906, quando Paulo de Almeida Lustosa se formou em Odontologia, na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, com 19 anos. Aqui mesmo, no Rio, passou 2 anos clinicando e depois voltou a São João D'El Rei, sua terra natal. Sem recursos para montar seu próprio consultório, ficou clinicando algum tempo entre a população rural, com um instrumental improvisado, fazendo extrações e pequenas obturações.

--- "Naquele tempo --- segundo dizia --- o povo sofria muito de dor de dentes. As condições para se fazer um "restaurado" eram mínimas. Uma grande carência de material de trabalho fazia com que a gente funcionasse apenas como executor de extrações". E foi este sofrimento popular que o sensibilizou para o grande problema das dores de dente. O ácido fênico já existia, mas sua aplicação tinha de ser feita com algodão. Além de provocar queimaduras na língua e gengivas, o curativo tinha de ser trocado constantemente, já que o algodão se alterava ao contato com a saliva. Dr. Lustosa procurou desenvolver uma técnica própria para resolver o problema. Depois de sérios estudos e já clinicando em seu próprio consultório, na cidade, concluiu que a cera de abelha era ideal como "agente tapa-buraco". Seu grande problema era como espalhar por todas as pequenas quantidades os ingredientes necessários para cortar a dor.

Em 1922, na comemoração do Centenário da Independência Brasileira, acabou chegando a um resultado final: a criação da milagrosa "Cera Dr. Lustosa", que obteve imediata aprovação das autoridades sanitárias da época, sendo registrada como medicamento oficial contra a dor de dente, pelo Ministério da Saúde. Muito eficaz para o mal e de baixo custo, o produto que até hoje não encontrou similar no mercado, continua vendendo 2 milhões de unidades por mês, no Brasil, e, até em outros países. Foi lançado no consumo pela Casa Hermany, uma das mais tradicionais do ramo, no Rio de Janeiro. O estardalhaço da campanha publicitária de lançamento vinha por conta de uma mulher com um lenço amarrado ao redor do rosto e abaixo versos de Bastos Tigre. Desde essa época, a cera passou a figurar na relação dos medicamentos antológicos, como a Pílula de Erva de Bicho, as Pílulas de Vida do Dr. Ross ou o Elixir de Paregórico, e, nos armários de primeiros socorros de todas as casas brasileiras. Não há aquele que desconheça a eficiência do produto que ele criou. Essa eficiência é comprovada pelo próprio ex-ministro da Saúde, Rocha Lagôa, que em 1972, ano do cinqüentenário do lançamento do produto, enviou carta ao dentista, afirmando:

"Quando, com natural alegria, o senhor comemora os 50 anos de seu produto "Cera Dr. Lustosa", sinto-me no dever de apresentar-lhe os melhores cumprimentos em nome dos milhões de brasileiros que, um dia, encontraram alívio no medicamento de sua fórmula e fabricação.

Dos remédios populares, não se sabe de outro que haja alcançado tanta receptividade, vendido que foi até no Japão. Inúmeros produtos, com igual indicação haveriam de ser postos no mercado. Alguns deles tiveram pequena duração. Outros se mostraram mais resistentes. Não houve um só, entretanto, que, durante 50 anos, se mantivesse na preferência das classes pobres tal como a "Cera Dr. Lustosa". Grandes, portanto, foram os serviços que o Sr. prestou à nossa gente, pelo que há de merecer a admiração e o respeito de todos nós. O Ministério da Saúde não quer ficar ausente das homenagens que hoje lhe são prestadas. E aqui está, nestas linhas, com os mais justos aplausos à sua gloriosa vida".

* REF.: O GLOBO - 15/01/1975 - PÁG. 33.